Oi Tatá,
estou aqui na cozinha te escrevendo enquanto a vó Lita descasca as laranjas da terra pro doce.A cozinha tá muito cheirosa, só você vendo; e por falar nisso, quando é que você vem? Estou com muitas saudades de ti, minha irmã. A vó Lita está igual à vó Tota, não consegue andar muito, os joelhos não deixam e eu não quero ficar pedindo todo o tempo que ela me leve aí pra te ver, mas que a saudade é grande, lá isso é. Bem que as vós poderiam morar mais próximas, né? Fico aqui matutando como é que papai e mamãe se conheceram morando tão longe um do outro? Vá saber, mas o que a vó Lita conta é que foi amor à primeira vista.Esta é outra coisa de que me pergunto.Eu vejo gente, bicho e não fico apaixonada.Se bem que não sei ao certo o que é ficar apaixonada. Pergunto pra vó e ela diz que eu saberei no tempo certo.Vá lá! Me conformo em ficar imaginando como foi o namoro dos nossos pais.
Mexo no álbum de fotos, paro numa onde eles aparecem sentados na grama perto do riacho fazendo um piquenique. Lembra desta? Os dois sorridentes que só. Mamãe com um vestido xadrez todo rodado parecia uma flor sentada ao lado do papai estendido na toalha com a mão apoiando a cabeça, posando pra foto.Depois tem aquela do noivado, aqui na sala da vó, todo mundo em volta da mesa do bolo e o papai colocando a aliança no dedo da mamãe. Aí, pula já pra uma do casamento. A entrada da mamãe de noiva de braço dado com o vô, todos os dois sérios, mas desconfio que por motivos diferentes. Acho que o vô, por querer parecer fortão no dia do casamento da única filha e a mamãe pra segurar o choro naquela emoção toda. Nas páginas seguintes tem mais umas deles na viagem de lua-de-mel pra capital e depois somos nós, pequenininhas, no colo da mamãe, uma em cada braço dela.Você era mais careca que eu e hoje tem mais cabelo.Que injustiça, isso!
Tem foto nossa por páginas e páginas.A gente mamando, engatinhando, fazendo birra, comendo papinha, ih, um monte.Eu sempre fui a mais alta de nós duas.Lembra daquela vez que você quis me ajudar a sair do cercadinho e me deu uma cambalhota? Eu não lembro, mas a vó Lita diz que foi assim.Fiquei com um galo na testa. E quando estávamos com seis anos e o primo Ciro foi nos ensinar a andar de bicicleta? Nossa! Tomamos tantos tombos e ralações que até hoje tenho umas marcas nas pernas.Você também, né?
A gente brincava muito.Era tão bom.O quintal era nosso mundo e a gente aproveitava cada pedacinho dele. As brincadeiras só paravam quando mamãe chamava pro almoço, pro lanche... e à noitinha, já de banho tomado, esperávamos papai chegar pro jantar.A família toda reunida.
Tão diferente de hoje, né? Cada uma de nós de um lado da cidade.Eu com a vó Lita, você com a vó Tota e a distância que separa as duas casas, separa nós duas também. As vós fazem de tudo pra gente, eu sei, mas nada fica bom demais sem você por perto, Tatá.Ontem eu achei a foto feita pra missa de mamãe e papai dentro dum livro de receitas da vó.Quando ela me viu com a foto nas mãos, pediu que eu guardasse de volta aonde achei.Desviou o olhar e foi pra dentro da cozinha resmungando alguma coisa, mas sei que estava disfarçando o choro na minha frente.Eu também faço isso ás vezes, pra não deixá-la triste, mas a gente sabe que nunca irá esquecê-los, que nosso amor por eles é eterno ( vi no dicionário: quer dizer que não acaba nunca).Já se passaram dois anos e eu ainda não acredito muito que tudo foi verdade.Estou sempre esperando ouvir mamãe me chamando pra entrar, pra tomar banho, pra fazer a tarefa de casa...e você?
É uma pena que a gente não tenha ficado junto, mas a gente sabe que as vós não tem condições de criar nós duas ao mesmo tempo.Fazer o quê, né? O negócio é estudar bastante pra quando a gente crescer, voltarmos a morar juntas, mas enquanto a gente cresce, vamos dar um jeito de nos vermos mais, tá certo?
Um abraço apertado da irmã que te ama,
Tami
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Com este conto participo da BC proposta pelo Christian Louis, do: escritos lisérgicos.blogspot ( aqui).Faça uma visita e participe vc também.
Com este conto participo da BC proposta pelo Christian Louis, do: escritos lisérgicos.blogspot ( aqui).Faça uma visita e participe vc também.
Tanto viver, tanto sentir em apenas dois anos. Com cheirinho de cravo e canela na cozinha, um conto que emociona.
ResponderExcluirBj
Que coisa mais linda!!! parabéns por nos colocar sentada contigo a´pi na cozinha, sentindo cheirinho do doce e tudo mais.
ResponderExcluirTu és danadinha! Adoro te ler e quando voas na imaginação, me encanto ainda mais!
PARABÉNS pra ti e pelos 2 anos do blog do Christian! beijos,chica
Menina, que delicia o jeito que você escreve, parabéns.
ResponderExcluirFiquei aqui lembrando do cheirinho que vinha da cozinha da minha bisa...ai como o tempo voa...
Beijos
Jack
www.meucantinhos.blogspot.com.br
Calu, este conto foi uma viagem no tempo. Você tem um dom de fazer o leitor mergulhar no mundo que criou que é impressionante.
ResponderExcluirQuantas lembranças bem descritas, desde o detalhe das laranjas sendo descascadas para fazer um doce quanto as fotografias. Eu admiro autores que conseguem fazer descrições minuciosas sem tornarem-se cansativos. Infelizmente são raros.
Ler seu conto foi como folhear o álbum de fotos antigas, amareladas pelo tempo... Muito show!
E o final não ficou melancólico, do contrário, foi determinado. As irmãs se esforçarão para ter uma estabilidade e finalmente poderem ficar juntas.
Uma estória de separação apenas provisório.
Meus muitos parabéns e muito obrigado por comemorar comigo os dois anos do Lisérgicos parceira!
=> CLIQUE => ESCRITOS LISÉRGICOS...
Calu, você nos faz mergulhar numa viagem doce e encantadora. Um história linda recheada de sensibilidade e ternura. Uma separação marcada por intensos momentos de amor que a distância não consegue apagar . Parabéns querida
ResponderExcluirBeijos
Gracita
Oi Calu
ResponderExcluirMuito bonita sua participação na BC do Chris. Que vc escreve bem, isso eu não tenho dúvidas! Eu li todas as participações até agora e só vc e a Valquíria não escreveram sobre morte kkkkkk, das que eu li, foi uma coincidência meio mórbida kkkk.
Bjos.
http://ashistoriasdeumabipolar.blogspot.com.br/
Ahahaha! Pior que é verdade! Esta comemoração acho que foi a mais letal da blogosfera!
ExcluirAs coisas mudam
ResponderExcluirDepois de um tempo você começa a perceber que nada nessa vida é
pra sempre e que tudo pode de alguma forma ser mudado,
percebe também que as pessoas mudam, que os pensamentos mudam,
e que se você não mudar, a vida muda você
amar significa se dar por inteiro
que verdadeiros amigos são,aqueles do qual sentimos
saudades .
Quando penso saber de tudo ainda não aprendi nada.
a natureza é a coisa mais bela na vida.
Deus não proíbe nada em nome do amor.
o julgamento alheio não é importante.
o que realmente importa é a nossa paz interior.
se pode conversar com estrelas
se pode confessar com a lua falar das saudades,
que inevitavelmente dói ,e feliz é aquele que tem motivos para
sentir..
Linda e abençoado seja sua Noite bençãos de Deus
para você ,Beijos e carinhos meus ,Evanir.
Lindo lindo lindo, como tudo o que vc escrvee Calu.Envolvente. Simples assim. Antes de saber que era um conto, tava aqui toda triste pensando que fosse com vcs, toda preocupada: como assim meu Deus, os pais morreram tao cedo assim?
ResponderExcluirAo mesmo tempo é uma historia bem real nao? qts meninas sao separadas e amparadas pelas avós?
Gostei mt Calu. Vc é uma escritora mt sensivel. E tenho que revelar que falou de vó, mexeu com todos os meus sentidos...
Oi Calu, conforme fui lendo o seu conto fiquei me imaginando escrevendo esta carta, parece que fui refazendo o caminho vivido pelas irmãs, a dor da separação, mas a certeza de que um dia ficarão juntas! Muito lindo! Parabéns minha amiga!
ResponderExcluirUm excelente dia pra vc! :))
Bjssss
viveraprendendo.com
Primeiro, obrigado por comentar lá no Espelhando e Espalhando Amigos.
ResponderExcluirÉ sempre bom ler, escritos que nos leva a reflexão, aprendemos um pouco mais e nos tira as amarguras.
Muito bom mesmo.
Abraço
Que lindeza de conto, minha querida...pleno de sentimentos, absolutamente VIVO... vi cada cena...
ResponderExcluirBeijinhos meus pra ti, Calu,querida
Valéria
Olá, queria amiga Calu
ResponderExcluirÉ tão bom entrar no mundo do faz de conta ou do mundo real contado com o coração (fica tão diferente!!!)...
Gosto demais de doce de laranja da terra e minha tia faz pra mim e me traz quando me visita ou vou pra casa dela na roça... É uma delícia!!!
Pude contemplar o seu texto e sentir o cheirinho daqui... de cravo e canela em casca... Hum!!!
Bjm de paz e pascal
Que linda a carta, lembrei de do morei em outra cidade eu e meu irmão nos escrevíamos toda semana e claro a dele sempre começava -Olá tata como vai?
ResponderExcluirDeu saudades....parabéns arrasou.
Olá Calu,
ResponderExcluirUma leitura para reflexões. Que linda carta. Você nos faz mergulhar entre as palavras...
Beijos mil
Bom dia,Calu!!
ResponderExcluirNossa!!!Que lindo! Fiquei profundamente comovida...nem consigo imaginar ter crescido longe da minha mana...
Beijos e meu carinho!
Que linda história Calu, enquanto lia parecia ver as cenas descrita por você. Também me fez lembrar da minha infância,dos meu meu vô e vó (só conheci os maternos) dos meus pais que já se foram e de meus irmãos, hoje todos ocupados com suas vidas, mas tentamos não perder o contato. Parabéns por sua participação ficou maravilhosa. Eu também estou participando. Bjus e felicidades.
ResponderExcluir=> Gritos da alma
=> Meus contos
< => Só quadras
Olá!
ResponderExcluirCalu
Parabéns pela participação na BC
Realmente... seu relato é de uma clareza e sensibilidade que nos emociona. As lembranças bem descritas, uma viagem doce e recheada de ternura.
...Temos um tempo não muito longo para aprender a viver, com lembranças e saudades e, quem sabe, descobrir formas para um reencontro na maioria dos casos mais difíceis. Dois anos se passaram, as vidas seguiram seus rumos, mas o tempo nunca apagou a lembrança. Apesar da distância e de possibilidades novas, porque não manter esperanças de um reencontro? Ainda iremos ver uma carta com essa emoção.
Meu carinho
Bom final de semana
Beijos
Que linda carta, Calu!
ResponderExcluirNada melhor do que a cozinha da vovó... senti até o cheirinho da grama perto do riacho... rs abraços
Olá Calu, parabéns por sua participação.
ResponderExcluirLinda descrição que me fez viajar até esta deliciosa cozinha. Beijinhos.