domingo, 28 de maio de 2023

Um luxo só


 

 Foi mês passado que estávamos eu e a filha bem confortáveis à mesa do café da manhã diante da varanda aberta para o mar que a conversa brotou naturalmente caindo por sobre as delícias que provávamos. Disse-me ela: 

__ Mãe, você adora um momento como esse ,neh! Tomando seu café sem pressa, tendo todo o tempo que quiser para sua rotina.

___ Claro, respondi, sorrindo. Mais que claro, perfeito!

Um luxo ao qual dou muito valor desde que o alcancei e do qual pretendo desfrutar ao infinito enquanto dure. Estar em constante regalo das boas coisas que a vida oferece podendo degustá-las com a devida apreciação, aproveitando o que de maior interesse se apresenta e retornando ao começo disso tudo sempre que desejar, é um luxo...alto luxo. 

Reunir gostos, belezas e boas companhias pelas horas que os dias espalham é somatório de benesses para o contar e o cantar a vida.

Tenho imenso apreço por essas dádivas conquistadas na maturidade, pois com elas e, em seus bônus, vou compondo ramalhetes floridos nas belezas contidas em momentos assim.




" Entregue-se, sem vergonha e sem sentimentos de culpa, às delícias do ócio. Aprenda a andar sem ter de chegar a lugar algum, simplesmente gozando o mundo que nos cerca!  Faça o fantástico turismo gratuito dos livros. Você irá a tempos e lugares onde avião algum pode chegar. Há também o mundo maravilhoso da música. Lembro do senhor Américo, que nos seus 85 anos descobriu a beleza da música clássica e a ela se entregou até a morte, como se ela fosse uma amante."

( Rubem Alves: se eu pudesse viver minha vida novamente)





sexta-feira, 19 de maio de 2023

Quando o silêncio fala




 Desconfio que pensamentos são imantados e com tal força ligados que se os pendurássemos em um varal teríamos  um acervo de bandeirolas de muitas cores,  mas de formas bem similares.

Na toada dos ditos populares, ouve-se: tempo vai, tempo vem; tendo entremeado nesse vai-e-vem os pensamentos ali trazidos nos borbotões dos instantes.

Ao buscarmos um rótulo para tudo acabaremos por nos atolarmos em preconceitos do que nomeamos e cairmos na armadilha do círculo virtuoso que de virtude não tem nada, tendo sim crachá aprisionador da ideia/intento/desejo.

Ando novidadeira, ansiando por outros prados, sons amenos, horas calmas, contemplativas. Ando sem andar, mas querendo me mover pelas aquarelas desejadas.

Sonho, mas não só. Penso, mas não retenho o desenrolar do desejo que vai nas asas dos pensamentos.



( Natália Correia- Como dizer o silêncio/trecho) 




sábado, 13 de maio de 2023

Amor infinito



Quando a linguagem do amor acontece, ultrapassa forma e natureza, expressa-se para além do visto e abarca o infinito. 

Quando se fala em nome do amor, o coração reflete-se no olhar e se deixa ler silenciosamente.

Quando por amor se age, os gestos se expressam sem legendas.

Quando em nome do amor se atua, o palco da vida atrai reconhecimento.



" De tudo ao meu amor serei atento

Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto

Que mesmo em face do maior encanto

Dele se encante mais meu pensamento[...]"

( trecho:Soneto da fidelidade/Vinicius de Moraes) 



Mãe, aquela que a cada dia descobre um novo significado para o verbo amar.


Mãe, aquela que cata as estrelas para fazer brilhar os olhos dos filhos.



Um Feliz Dia das Mães para todas as amigas da blogosfera!




domingo, 30 de abril de 2023

Nas cores de Abril



CORES DE ABRIL

          

Fui lá, entrelaçar mãos

na roda dos afetos.

Fui lá, colher sorrisos e semeá-los 

no canteiro dos amores crescidos.

Fui lá, embalar corações

em cantigas reconhecidas.

Fui lá, girar ao contrário 

os ponteiros das horas.

Fui lá, cozer o ontem, o hoje

e o amanhã com linhas vivas

num bordado caprichado.

Fui lá, arrumar ramalhetes

de flores e cores variadas.

Fui lá, somar memórias

às gargalhadas francas.

Vim de lá com a alma faiscante

em brilhos adornando meu olhar.




terça-feira, 4 de abril de 2023

Palavras acordadas


*
 A escritora dormiu.

As palavras se estocavam debruçadas umas nas outras, esperando.

A escritora via o sol, sentia a brisa, olhava a lua.

E nada escrevia.

Chegava o Natal, o Carnaval, a Páscoa...

Nada.

Lápis, caneta, papel, tablet, computador, máquina de escrever(!?), cadê?

As palavras estavam revoltadas, ensaiavam uma rebelião.

A escritora continuava dormindo, à sono solto.

Chega de poesia!

Então, vamos à prosa.

Chega de prosa!

A escritora ouvia delações, reclamações, discussões.

Tudo inútil.

Silêncio.

Psiu! Fiquem quietos, a escritora está dormindo.

As palavras se desmancharam em letras perdidas.

Se uniram em línguas desconhecidas.

Enlouqueciam esquecidas.

Acorda, escritora, acorda!

Gritavam, gemiam, choravam, sussurravam.

Um olho piscou, um braço espreguiçou...

As palavras se abraçaram:

A escritora ACORDOU!

( poema de Regina Helena Dias, in: Coletânea Sumo/2019)

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