terça-feira, 22 de outubro de 2013

Tem ferrugem aí?










Primavera chegada, ainda pisando de mansinho os dias, alternando abafamentos com claridades típicas da estação e em mim disparando nos ares do tempo meus afazeres.Hora de pegar meu boné xadrez, minha lupa e sair circundando cada centímetro da casa procurando defeitinhos e quebradinhos.Caderninho na mão anoto tudo pra não deixar passar nenhum reparo a ser feito.

Tenho aprendido muito nestes últimos sete anos aqui.Me descobri uma intrépida reparadora de pequenos consertos.Já sei distinguir entre fita isolante e uma fita veda-junta,húhú!Não riam, porque pra mim, rata da cidade, isto foi um avanço e tanto.Outro que se seguiu a este, foi o do desengripante.Morar perto do mar cobra seu preço.A maresia corrói tudo que tenha resquícios de ferro e a manutenção é trabalhosa.Pois foi numa destas reparadas que ouvi do técnico do portão da garagem o nome do tal produto desengripante.Claro que fiz cara de entendida e disse que compraria no dia seguinte.

Chegando na loja de materiais descobri que o tal era, nada mais nada menos, que um lubrificante doméstico e funcional.Amacia fechaduras, correias,motores de eletro domésticos, janelas emperradas e mais o que sua imaginação quiser.

Na minha, imaginei o quanto um desengripante mágico seria eficaz pra amaciar uma zanga, uma palavra ríspida, uma intolerância, uma explosão de raiva e tantos outros sentimentos que estão cobertos por uma camada tão densa de ferrugem que nem deixam outras possibilidades lhe darem um lustro.Cascorados em vermelho-ocre embaçam qualquer claridade que tente se infiltrar na couraça armada e ainda sustentam enganosamente uma razão corrosiva que despreza os sentimentos alheios.

Quantas ferrugens deixamos crescer em nós e às vezes até nos orgulhamos disso; ledo engano.Tudo o que deixarmos nos encouraçar também irá nos aprisionar podendo nos afastar de boas renovações, de novos caminhos.Todos temos histórias de ferrugens ensinadas, assumidas, incorporadas, o que não quer dizer que sejam irremovíveis, se assim o desejarmos.Uma pintinha de ferrugem aqui, outra acolá, parecendo marquinhas inofensivas de nossas defesas, podem com o tempo alastrarem-se assustadoramente nos empedernindo debaixo delas.Termos o bom senso de distinguirmos entre as manchas nocivas e as que nos embasam sem confundir ambas, é essencial.O que não faltam são oportunidades pra isso, que não devem ser perdidas.Bora, passarmos uma flanelinha com desengripante em cada manchinha ferruginosa que nos paralisa e afasta das renovações? 





"Eu quero desaprender para aprender de novo.Raspar as tintas com que me pintaram.Desencaixotar emoções, recuperar sentidos!" 


Rubem Alves 


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Imagem:grazytumblr

16 comentários:

  1. Uma beleza, Calu! E dá-lhe desengripante! Mas... a imagem revela uma linda ferrugem, quase arte! Vá entender... Um abraço forte!

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  2. Maravilha,Calu! Temos mesmo que nos observar e verificar o que precisa se melhorado e reparado! Não podemos nos deixar enferrujar ...
    Hoje lã na Beth( Mãe Gaia) ela fala algo que casa bem com teu texto...Pequenos reparos ,melhoras em cada um pra que as janelas não fiquem todas quebradas... beijos às duas,chica

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  3. Calu, reflexão lindona! Vamos cuidar do nosso interior com carinho, sempre temos coisinhas p "lustrar/aperfeiçoar"... Ferrugens são desastrosas e quando vão adiante, destruidoras...

    Um beijo

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  4. Ou seja, a vida nos ensina e basta termos vontade de aprender, não ficar batendo em ponta de faca, ir se adaptando, conhecendo pessoas que nos ajudem, além dos parentes, pois tem gente que se fecha só nos parentes, na convivência familiar e não alarga os horizontes nas amizades e com gente que nos ajuda a resolver coisas muito mais do que, às vezes, os próprios familiares.
    Digo isto, porque temos conhecido pessoas tão boas, tão importantes em nossa vida, são pessoas que fazem um bom serviço, que dão o melhor de si e nos atendem nos momentos difíceis. Esses eu guardo com cuidado no coração.
    Na nossa faixa de idade, saber desaprender para aprender de novo é uma arte e ao mesmo tempo uma demonstração de que nem tudo o que aprendemos ou fizemos era o certo, sempre terá novidades e modos diferentes de se fazer as coisas, temos que nos readaptar aos novos tempos, isso sim.
    um beijinho carioca minha querida.


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  5. Gostei. Com seria bom se não deixássemos criar ferrugens em nossas relações?....
    Beijos.

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  6. A vida é muito curta e temos mesmo que passar uma flanelinha com desengripante em cada manchinha ferruginosa
    Não vale a pena guardar mágoas e rancores, não?
    Lindo texto, Calu
    Deixo um beijinho carinhoso para você
    Verena e Bichinhos

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  7. Oi Calu!
    Talvez devêssemos ingerir uma colher de desengripante por dia... rsrsrsrs

    "Eu quero desaprender para aprender de novo. ..." Fez-me lembrar um fato: quando me vi cadeirante, fiquei apavorada e só falava do que 'podia fazer ANTES'... então um amigo foi pegando tudo que estava em volta (lápis, livros, CDs, pequenos objetos de decoração...) e me falou pra segurar como pudesse... com os braços. Quando eu já não aguentava mais, ele falou pra eu abrir os braços... caiu tudo.
    "Pronto!!! Agora eu te ajudo a pegar só o que você pode segurar!"
    E, assim, acho que "desenferrujei" e pude seguir em frente ;-)

    Abração
    Jan

    "

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  8. Oi, Calu! Que santo remédio seria esse de usar desengripante contra maus sentimentos! Gostei muito do final do texto, surpreendente, por sinal... assim como em casa, precisamos fazer reparos periódicos na alma para não permitir que os sentimentos nocivos tomem o espaço que deve ser reservado ao que de melhor podemos (s)ter.
    Quanto aos reparos domésticos, esses dias precisei limpar o ralo do chuveiro, hahaha... superação necessária, saber se virar é primordial. Um abraço!

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  9. Olá, querida amiga Calu
    E foi com esse pensamento que comecei a blogar...
    O primeiro post falava do Caeiro falava das camadas de tintas velhas uma sobre a outra... associei-o ao seu post e, quando me vejo tomada de ferrugem, záz com a química do amor em mim para resolver o que estiver corrompido...
    Excelente post com um começo real de uma situação cotidiana que nos leva à profundidade!!!
    Bjm de paz e bem

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  10. Com o tempo percebe-se o processo do envelhecer.
    Tempo de recriar e remodelar contra as ferrugens,
    Tempo de lubrificar as relações, as manias,
    tempo de saber como desengripar-se.

    Bela analogia Calu com toda arte e sabedoria.
    Carinhoso abraço amiga.
    Bjo de paz e luz.
    Duplo parabéns em Outubro:professora e poetisa.

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  11. Olá Calu, fantástica essa comparação! Antes que as nossas ferragens se quebrem nunca é tarde demais para começar a olear o que está ficando mais deteriorado! Vamos embora! Deixemos em primeiro lugar que nosso coração amoleça. Beijinhos e óptimo dia! Ailime

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  12. Ai Calu,uma interessante comparação que só uma escritora sensivel como vc seria capaz de pensar! E temos mesmo tantas ferrugens...rss...muito obrigada por seu carinho no meu niver! Adorei te ver por lá! bjs,

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  13. Querida Calu, primeiramente deixa te dizer que o ferrugem está na moda. Tenho clientes que chegam com encomendas de mesas em ferro e pedem que lhe demos um banho de ferrugem... e "o freguês tem sempre razão". hehe

    "Segundamente": olha, sentimentos com ferrugem geram relacionamentos enferrujados, mas não basta que só um pegue o paninho com o desengripante. Os dois devem querer acabar com as pintinhas ou elas se transformarão em corrosão.

    Beijos sem pintinhas.

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  14. Calu, querida, olá!
    Me senti tão feliz e privilegiada por ser mencionada em seu post anterior, que senti que não seria o bastante agradecê-la somente em seus Fractais, mas tbm em Meu Doce Lar:

    http://meudocelarbykarinfilgueira.blogspot.com.br/2013/10/low-rooled-updo-ufa-achei.html

    Obrigada mais uma vez pelo carinho e presente (foi um presentão!)

    Deus abençoe!
    Bjs!!!

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  15. Pois é, Calu, vivendo e aprendendo. Também eu estou fazendo uma reforminha aqui, sozinha, e já sei o que é uma retroescavadeira, uma betoneira , um sapo mecânico...Até coloquei vigas baldrami na alma para aguentar os trancos da vida rs...Beijo pra você!

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  16. Calú
    Amo vir aqui. Sempre me delicio com o que você escreve. E quanta ferrugem temos que lixar no cotidiano.

    Desengripante amaciante eficaz para a zanga. Adorei. rs rs. Tenho que comprar esse produto mágico para espalhar neste trânsito caótico de Sampa,pois as pessoas andam irritadas e sem paciência. Sempre vejo alguém esbravejando

    Beijos.

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Teu comentário é o fractal que faltava neste mosaico.
Obrigada por tua presença querida!