sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Crônicas Restritas










Num elevador; cena 1:

Carregando um chapéu panamá (confeccionado no Equador) entra atrás dum sorriso, dentro do costume típico em cima do sapato bicolor, o passista do samba. Tipo brejeiro, entre trejeitos reconhecidos puxa conversa, gargalha e areja o ar da pequenina boite-móvel.Todos descem mais leves.



cena 2:

Gesticulando muito e em mesma altura de timbre, entra no elevador um híbrido de celular-humano que trava acalorada discussão com a extensão de ouvido.Ignora os circundantes e não ameniza os impropérios, deixando um pesado constrangimento no ar viciado.Chega o destino.Abre-se a porta da caixa-móvel e ao dar o impulso escapa-lhe das mãos a chave do carro que desliza perfeitamente entre o vão da porta e o poço.Olha desolado pro precipício de alumínio enquanto todos lhe ultrapassam... 




cena 3:

Pequenote buliçoso tenta se desvencilhar da mão materna que o traz bem presa.Reclama do calor, pergunta porque esperam, enfia o nariz na bolsa da mãe à procura de algo, bate o pézinho impaciente, sorri e faz beicinho, tudo junto no incômodo que lhe toma.Assim que as portas se abrem, se lança elevador adentro olhando à volta e declara:
___ Isso é um quartinho que sobe e desce, né mãe? 




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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Saias Sementeiras






(Renata Domagalska)




Folheando umas páginas que me saciam a sede por boas reflexões reencontrei uma imagem poética que compara as mulheres às árvores;frondosas, fortes, copadas, floridas, dadivosas... em suas muitas capacidades de suprir múltiplas carências esquecendo-se das próprias.Típico das grandes árvores que, apesar de todos os reveses a que são submetidas, conseguem sobreviver florindo a vida dos que lhe cercam.


"[...]uma enorme avó, um choupo.Essa árvore específica tinha sobrevivido por vários séculos a todo tipo de intempérie, inundação, congelamento e a todas as criaturas que tentaram corroê-la.Ela era o que nós chamávamos de "árvore da nevasca no verão" porque lançava suas sementes diminutas presas a uma reluzente penugem branca.Elas voavam e flutuavam nos ventos quentes da primavera, gerando uma tempestade de neve fina e transparente.Seria um equívoco imaginar que, por lançar suas sementes em saias cheias de babados, ela fosse frágil.Ela não era.Era uma guerreira[...]" 

( Clarissa Estés, Ciranda das Mulheres Sábias)







Estou ganhando a envergadura dum choupo e isto muito me envaidece, ser uma árvore-matriz, cercada de brotos floridos e buliçosos que enchem minha existência de cor e alegria e, com a chegada de mais dois novos brotos, este ano será de sorrisos infinitos.Vem vindo o Rafael ( irmãozinho do Miguel) e mais um irmãozinho(a) pro Felipe.

Meu jardim está bárbaro, né gente?



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Imagem: arte de Renata Domagalska, artista que produz belas pinturas impressionistas.Dentre elas, tem a série sobre o flamenco.Leveza, movimento, feminilidade e sensualidade estão presentes nas belas pinturas com as mulheres retratadas. 




sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Altas Fervuras










Tudo me parece em tom maior no verão; assunto recorrente por aqui, por acolá.O sol, já nas primeiras horas do amanhecer "arrosácea" o céu na mesma intensidade dos metais duma magistral orquestra regida a seu comando.A natureza acorda em alto êxtase e enche o dia de cores extremas.O som viaja nas ondas acaloradas que pairam inclementes sobre tudo e todos.É o tempo dos extremos.O calor aumenta as intensidades, as emoções e os desvarios.Dá pra constatar estes efeitos pra todo lado: no trânsito( argh!),nas ruas, nos rostos...

As pessoas que precisam transitar pela cidade neste dias estão aceleradas.Parece que sofrem duma alta voltagem coletiva que pulsa em berrantes volts. Andando apressadas buscando um abrigo da canícula,se espremem em qualquer centímetro de sombra, correm pra dentro de qualquer lugar que tenha um ar refrigerado decente.O cimento armado distribui as altas temperaturas como redoma sobre a cidade.Até os juízes do Supremo se apiedaram dos advogados e liberaram o traje esporte/social para o exercício da função.Só não há alternativas para os trabalhadores da ordem urbana.O pessoal que trabalha nestas linhas enfrenta a cidade aos 50graus/caos diários, suando em bicas atrás de britadeiras, carregadeiras, espalhadoras de manta asfáltica e tais.

Em ocasião passada fiz um post sobre esta situação apontando o sacrifício imposto a estes trabalhadores, especialmente; o que veio a fazer eco com o excelente post da colega Bia Haim( revolta e romance.blogspot), Uma questão de escolha (link). Vale a pena conferir.

Por outro lado...bom que haja, é um tempo que dá vontade da gente se espalhar, de ficar sintonizada no mesmo diapasão da natureza e ondular languidamente em frescores e preguiças.Já que o dia estende sua luminosidade até mais tarde, então cabe bem aproveitarmos os fins de tarde, quando corre uma brisa amorosa e, sair pra beira-mar, pra beira-rio, pra beira-parque, pra "beirar", adentrar e se entregar às belezas da estação.As horas cheias de cores vivas transluzem nossa alma em arco-íris e a vida reacende luminosa.

Bora curtir o que de bom há__" ...Neste verão tão quente e tão lindo que nos tem dado dias de um azul sem fim", conforme comentou a querida Mila, do Pitanga Doce.blogspot ( link)








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segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Esclarecimentos aos visitantes na cidade...









A partir de hoje olharei os céus com ainda mais atenção depois de ter lido uma reportagem no caderno "Bairros" do jornal.Nela um biólogo/ufólogo destaca a cidade de Niterói como destino turístico de óvnis, principalmente a Região Oceânica, onde moro."Alô, alô, Marcianos, aqui quem fala é da Terra..." cantou Rita Lee e repito eu nesta oportunidade.Nunca me debrucei sobre esta discussão: se há ou não extraterrestres, mas não descarto nenhuma possibilidade no Universo.Disse-me certa vez um professor de geometria e poeta, que éramos altamente soberbos ao nos considerarmos os únicos seres em todo o vasto Universo.Não levanto a discussão, porque acho que ela seria melhor ao vivo do que por declaração, daí mantenho o ponto de interrogação na questão.

Me lançando então em devaneios,convido vcs a acompanharem a cena: lá vou eu caminhando contra o vento, aproveitando a brisa marinha, pensando na vida...quando de repente, desce uma nave do céu e dela sai um extraterrestre.Não me apavora, apenas me espanta, sim porque o devaneio é meu e não me dou bem com monstrengos; então o visitante se assemelha a nós em aparência, ok?E, além disso ele possui um aparelhinho tradutor instântaneo que imediatamente entra em ação.Dou-lhe as boas vindas.Mostro-lhe os arredores. Aponto as belezas naturais e pergunto o que o trouxe até aqui.Ele me diz que é um explorador-pesquisador e quer conhecer melhor nosso país e em especial as cidades do Rio e de Niterói.

Diante disso, como boa anfitriã, começo a desfiar-lhe um rosário de recomendações,não sem antes avisar que os documentários contidos nas Voyagers 1 e 2, não correspondem à total realidade que vivemos aqui no planeta. Nelas só há registro das belezas, as feiúras ficaram de fora, então, cabe ressaltar este "esquecimento" feito pelos responsáveis das duas cápsulas para que ele não se confunda nas suas expectativas por aqui.Assim,continuo lhe recomendando:

 __ Tome cuidado com seus pertences, mas não resista a um assalto.Entregue tudo.Podendo, corra.Se visitar monumentos fique atento aos trombadinhas, aos exploradores de plantão e aos horários afixados, estes não são para serem levados a sério.Indo à praia, leve um farnelzinho discreto, pois um picolé está pela hora da morte.Os preços na areia sempre foram um tanto inflacionados, agora com a proximidade de um grandioso campeonato esportivo chamado Copa do Mundo de Futebol, dispararam enlouquecidamente como nunca antes nesse país( tchs).Durma em sua própria nave porque os hotéis estão proibitivos.Uma noite só e, lá se vão todas as economias.Ao fazer o câmbio, não aceite o $Real.A nova moeda corrente é o $urreal.Fique ligado! Disfarce-se de nativo, porque se notarem que é turista e ainda mais de outra galáxia, você tá ferrado.Todos os preços e serviços lhe serão cobrados triplicados.Não compre nada que não couber numa sacola, por exemplo.O Maracanã não está à venda ( há controvérsias).Olho vivo, cautela e boa sorte em suas andanças, finalizei.

Ele me agradeceu.Fez uma mesura e disse que deixaria suas explorações por aqui para o futuro.Entrou na nave e sumiu num facho de luz.Ôops, acho que assustei o visitante.







Sinceramente, creio mesmo que os perigos ameaçadores não vem dos extraterrestres e sim dos intraterrestres.





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sábado, 18 de janeiro de 2014

De pés no chão











Tem chovido boas dicas pra se aproveitar bem o verão.Mesmo com a concorrência em alta(rs), vou me juntar ao time, apesar de não ser uma fã ardorosa da estação, ainda assim não fico só destacando os defeitos, os incômodos que, afinal, eram bem maiores quando eu estava na ativa tendo de enfrentar o caos de cada dia.Hoje, posso me dar o luxo de planejar, fazer e refazer a agenda do dia.Claro é que, os afazeres não dão trégua, mas com boa vontade e disposição( quando o calorão permite), vou aproveitando o bom da estação.


Para além dos refrescos necessários neste calor senegalês, há uma oportunidade que não deve ser desprezada a de andarmos mais descalços.Vocês percebem o quanto maltratamos nossos pés o ano inteiro? E, mesmo quando estamos em casa não lhes damos o conforto necessário.Os pobrezinhos carregam todo o peso e ainda são esmagados, torcidos, espremidos nos mais variados instrumentos de tortura moderna já inventados.Pois então, a hora é essa, o tempo é agora.Deixem seus pés livres, leves e soltos nas inúmeras texturas à disposição.Sintam as delícias que vem da base onde se pisa. Percebam o quentinho ou o friinho, o seco, o úmido, o liso, o áspero, absorvam as informações da terra, da areia, da água, da grama, do piso...sem se importar com o traje e, apenas sintam os pés no chão. 






"Ô pisa na fulô..."



Boas sensações pra vcs! Desfrutem bem o fim de semana!



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Imagens:tumbrl

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

O mundo bate do outro lado da minha janela









Levei um baita susto ontem quando estava lendo recostada ao sofá e de repente um baque surdo na janela ao lado me sacudiu;um pequeno passarinho se chocou contra o vidro da janela. Levantei num pulo e corri desembalada pra fora seguida pelo meu labrador e a tempo de socorrer o pequenino em cima do parapeito externo, ainda meio tonto pelo baque, mas vivo.Com uma das mãos afastava o afoito caçador de quatro patas enquanto corria com o passarinho na palma da outra mão em direção à pia mais próxima.Coloquei-o debaixo dum filetinho d'água ( ainda bem que havia água,tchs) para reanimá-lo.O pequenino foi se recompondo e logo se agitou sacudindo as asinhas pra voar rápido dali, lugar de certos perigos pra ele.Aconchegado entre minhas mãos, fomos pro jardim e lá o coloquei no cantinho do muro debaixo do pé de acerola e ele num bater de asas frenético alcançou os galhos mais altos e voou pra longe.

Demorei uns instantes ali parada acompanhando seu vôo e dos demais moradores dos ares locais imaginando como teria sido esta região muitas décadas atrás, quase inabitada por humanos, paraíso intocado, natureza pulsante e livre de ameaças estranhas.Como deve ter sido e ainda deve ser, difícil para os "donos do lugar" verem suas áreas tomadas por esta espécie estranha e predadora, nós, os humanos; modificadores do natural, apropriadores autocentrados, invasores...e todos os demais adjetivos relacionados não darão conta do tamanho da destruição por nós provocada.Estão aí as evidências, tanto locais, quanto globais pra confirmar a nossa mea-culpa. Há, sem dúvida, hoje em dia, intensas ações para minimizar estes efeitos, porém, sabe-se que o trabalho de décadas está ainda no começo e muito há para ser feito em prol do planeta e das espécies.Notícias diárias de abusos e depredações confirmam que os esforços precisam abranger todas as áreas do conhecimento/ação a começar pela educação alinhada numa visão holística.

Meu labrador aproximou-se devagarinho e deitou-se aos meus pés, gesto típico dele.Convivemos muito bem com uma população diversificada de passarinhos,em total harmonia.Ele nem se importa que venham beber sua água ou posar sobre o teto de sua casa, mas só não permite que entrem dentro da minha.Vira bicho!De resto, os voadores fazem pouso lá por fora, onde querem.Alguns nem tão bem-vindos assim, feito marimbondos, abelhas e outros espécimes que eu nunca havia visto antes de morar aqui.Me considero privilegiada por isso.Cuido do meu quinhão e colaboro com os arredores, quando possível, torcendo para que mais e mais humanos se reconheçam como parte da natureza e não como proprietários dela.Quanto à mim, acho que não devo limpar demais os vidros das janelas(rsrsrs...)  



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" Quem virá bater à porta?
Numa porta aberta se entra
Numa porta fechada, um antro.
O mundo bate do outro lado da minha porta."

(Albert-Birot apud Bachelard)









Imagem:(pinterest/beauty)


segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Esperas Recomeçadas














Manhã de verão
rompida luz clara 
 em tudo que há;
chamado ardente
pra tudo acordar.
Calor alado
 abrasa, 
aumenta o dia
estica a vida
em tom maior,
ressoa risos,
ecoa afetos,
nutre,
reluzindo no olhar
 claridade e névoa,
momentos ricos,
tomam lugar 
do antes vazio,
  presente estar 
dum coração
estreito no ir e,
revivo no chegar.
Calma espera
por outros dias,
destas horas
balançadas;
sopros do tempo
no ir e vir
dum balanço
suspenso.

(Calu)



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Imagem:weheartit







terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Brilhos n'alma





(Rubem Alves)



Há uns conselhos que logo as primeiras palavras ouvidas ou lidas nos convencem de imediato e, até nos perguntamos como pudemos passar sem eles por tanto tempo.São como brilhos n'alma que aderem ao nosso ser/estar no mundo.


No pequeno trecho da crônica do Rubem Alves, cada declaração carrega a verdade pura e simples, encontrada a cada dia que graciosamente repete seu espetáculo pondo em suas cores a esperança que mais e mais olhos se encantem e levem aos corações a beleza da vida.



A natureza é o show da vida. Os pintores e os poetas bem o sabem!















Rogo aos olhos
do meu coração, que
jamais fiquem míopes.




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Trecho do "Cantos do Pássaro Encantado", Rubem Alves

Imagens: giverny.org
wikipédia( Monet/ Renoir/ Van Gogh)

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

As crianças sabem o que dizem







Ninguém segurou a gargalhada ao ouvir a resposta do meu neto Miguel para a mãe, que ralhando com ele, perguntou: ___ Você quer ficar de castigo agora ou mais tarde?
___ Mais tarde, respondeu ele naturalmente.

Esta tranquila naturalidade das crianças nos pega desprevenidos desarmando qualquer bronca.E as tiradas filosóficas, então?Tem umas espetaculares, merecedoras de registro.Engana-se quem ainda hoje acha que as crianças não alcançam o cerne dos fatos.Elas estão cada vez mais perspicazes, mais atentas ao mundo em que vivem e ás pessoas com quem convivem.

Pedro Bloch, pediatra e dramaturgo, despertou para esta realidade e nos premiava com suas imperdíveis publicações na revista Manchete com o título: " Criança diz cada uma...", onde narrava situações impagáveis da sabedoria infantil.A legião de fãs era enorme.

" A cor do céu depende da hora, do tempo e de quem olha. Quem diz que o céu é azul, nem desconfia que, de noite ele pode ser preto e, quando vai anoitecendo, pode até ser rosa ou vermelho. Quem diz que o céu é azul, é analfabeto de céu."
( trecho do Dicionário do Humor Infantil, Pedro Bloch) 


Ao olharmos pra nossa infância achamos difícil que um dia tenhamos sido assim, tão leves, tão espontâneos, mas com certeza o fomos, mesmo que hoje não nos lembremos disto tão bem.Como considero importantíssimo mantermos vivo o elo com a criança que fomos, destaco algumas definições que ajudarão a trazer mais colorido aos primeiros dias deste novo ano, torcendo pra que aprendamos sempre com as crianças de ontem e de hoje; elas conhecem a magia do bem-viver.






AMAR__ É pensar no outro, mesmo quando a gente não está pensando.

ALEGRIA __ É um palhacinho no coração da gente.

ARCO-IRIS __ É uma ponte de vento colorido.

BOBO__ É uma pessoa cheia de coisas vazias. 

BRUXA __ É uma fada que ficou velha e perdeu a dentadura.

CRIANÇA __ Ser criança é não estragar a vida...




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